Comunicação e Sociedade, vol. 21

A revista do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade deixou, este ano, de publicar-se em papel passando, agora, a estar disponível apenas em formato digital.
O volume inaugural desta nova etapa na já longa vida da publicação foi coordenado por Zara Pinto Coelho e por Silvana Mota Ribeiro e tem o título genérico: “Género e Heterossexualidade – Discursos e Imagens na Publicidade e nos Media”.
Está disponível para download AQUI.

Luís António Santos

Um Dia com os Média

Convocar os cidadãos e a sociedade para refletir sobre os papel e o lugar dos media nas suas vidas é o objetivo da Operação Um dia com os Media, projeto que irá decorrer no próximo dia 3 de maio, dia mundial da liberdade de imprensa, com múltiplas iniciativas por todo o país.
Esta Operação surge num tempo em que as tecnologias e plataformas digitais permitem, como nunca, que os cidadãos se exprimam no espaço público, fazendo por isso sentido que o olhar crítico e participativo relativamente aos media seja, ele próprio, um exercício de liberdade.

Promovida pelo Grupo Informal sobre Literacia para os Media, esta operação congregará um vasto e variado conjunto de atividades concebidas e realizadas pelas mais diversas instituições, tais como bibliotecas, meios de comunicação, escolas, instituições do ensino superior, grupos de alunos, centros de investigação e formação, associações, universidades de seniores, movimentos, igrejas, autarquias e outras, glosarão o mote Um dia com os media: Que significado têm os media na nossa vida e como poderiam tornar-se mais relevantes?
São diversas as ações programadas, como sejam, programas de rádio e televisão, conferências, mostras, concertos, debates, projeção de filmes, concursos escolares, ações de formação, jogo lúdicos, ações de rua, entre outras.
A lista completa de ações pode ser consultada AQUI.

Toda a informação sobre a Operação pode ser encontrada AQUI.

Grupo Informal sobre Literacia para os Media

O Grupo Informal sobre Literacia para os Media é uma plataforma que reúne entidades públicas com missões no domínio da literacia para os media, sendo presentemente constituído por: Comissão Nacional da UNESCO, Conselho Nacional de Educação, Entidade Reguladora para a Comunicação Social, Gabinete para os Meios de Comunicação Social (GMCS) e Universidade do Minho – Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade.
Entre os muitos projetos desenvolvidos pelo Grupo, importa destacar o Portal da Literacia para os Media e o Congresso “Literacia, Media e Cidadania”, do qual resultou a “Declaração de Braga”.

Onde está a revista do Expresso?

Este fim de semana vinha, com o jornal Expresso, uma publicação semelhante às que estão disponíveis de graça nos escaparates de entrada dos supermercados.
Deve ter sido engano.
A Direção do jornal – que talvez tenha perdido tempo demais a deliberar sobre se considerava ou não uma resposta de Luís Marinho a Miguel Sousa Tavares como ‘uma resposta’ (no sentido legal, que lhe concede direitos especiais de publicação) – também precisava de olhar com atenção para os problemas sérios que o jornal aparenta estar a enfrentar na zona de acondicionamento final do produto.
Vejam lá isso, por favor…

Aquele anúncio dos cavalos é o quê?

No livro ‘O retrato de Dorian Gray’, Oscar Wilde escreve: “But beauty, real beauty, ends where an intellectual expression begins“.
Numa leitura um nada mais prosaica, Boss AC diz-nos, na letra da sua mais recente música, “Ó Homem fazias-me rico em vez de bonito”.
Há, em ambas as frases, a noção da mútua exclusão; no primeiro caso entre a beleza e a expressão intelectual e, no segundo, entre a beleza e a fortuna (alguns, certamente iludidos, poderiam até pensar que as duas são próximas).
A publicidade – a Publicidade de grande qualidade – sempre viveu na corda bamba que continua a esticar-se entre estas polaridades; sempre quis ocupar territórios que, em simultâneo, nos deslumbram e nos provocam; sempre quis cativar-nos com astúcia, com elegância, com humor. E sempre – sobretudo depois dos pioneiros anúncios do VW carocha nos Estados Unidos – fez por mostrar-nos que tinhamos direito a muito, a partir de muito pouco.

A mais recente publicidade televisiva da Portugal Telecom contraria tudo isto.
É lindíssima, mas não tem mensagem absolutamente nenhuma.
É caríssima e faz tudo para não o esconder.

O novo (e longo – outro detalhe de ostentação) anúncio mostra-nos um universo fictício, muito belo, descoordenado, aleatório, onde tudo pode acontecer (e com o dinheiro gasto – tudo acontece mesmo!) mas onde tudo vale muito pouco porque não há propósito.
Nesse mundo imaginário, com amazonas em câmara lenta e setas que, por entre nuvens de talco, rasgam o infinito, não há horizonte – os fundos são sempre negros – e não há cronologia.
O tempo e o espaço não existem e os indivíduos saltam e contorcem-se no vazio.
Não são gente, certamente (como diria o outro), porque gente não é assim – nós somos história, somos espaço e somos relações.
Os personagens azulados do tal anúncio rico, que afinal é muito pobre, são coisas, são instrumentos.

A PT, que não sabe o que há-de fazer ao dinheiro que ganha à custa dos inúmeros monopólios (ou pseudo ‘posições dominantes’) que detém, diz-nos que bem, bem, era sermos mesmo como os amorfos estrunfes do seu anúncio – alegres saltitões calados.
E ‘calados’ é, para eles, mesmo muito importante.

É só fachada.

Agora que vem aí a Primavera chega-nos aquela vontade de renovar a vida, a casa e o mundo. Mesmo que seja só cosmética e no essencial fique tudo na mesma, mudar as almofadas do sofá ou fazer um novo corte de cabelo dá logo um ar mais lavado. A criatividade renova.

 Com a crescente dificuldade de cada vez mais famílias pagarem as hipotecas da casa, a Brainiacs from Mars, uma agência americana de marketing não convencional de alto impacto, lançou uma campanha, que é antes de mais nada de auto-promoção. Também tem o seu lado de responsabilidade social e oferece uma experiência positiva e envolvente ao consumidor, uma win-win situation. Seja qual for a etiqueta que lhe quisermos colocar, o que é certo é que tem dado que falar e consiste no seguinte: a Brainiacs paga a hipoteca da casa em troca do uso da fachada como espaço publicitário, durante os meses que durar o contrato, que pode ir de um mês a um ano. O interessante é que se compromete a voltar a pôr tudo num brinco, pintando o espaço usado com as cores originais. É uma espécie de Querido, mudei a casa, mas só por fora.

Neste negócio o cliente vende a alma ao diabo e sujeita-se à reacção adversa da comunidade de vizinhos, já que a pintura é em cores berrantes, mas ganha duplamente com o pagamento da hipoteca e com a renovação das paredes. Entre pagar a casa e mantê-la ou passar a vergonha, a escolha pode não ser fácil mas em tempo de guerra não se limpam armas. Quem quiser candidatar-se pode fazê-lo colocando fotos da sua casa na página do Facebook e preenchendo o formulário de candidatura. Para os que preferem uma relação mais personalizada, a agência propõe o  uso de uma t-shirt publicitária em troca do pagamento de três meses de hipoteca.

Que se saiba ainda não o fazem em Portugal, por isso talvez seja uma boa ideia para a renovação dos prédios decrépitos dos centros das cidades e uma solução de recurso para o ‘Querido, entreguei a casa ao Banco‘, previsível para todos os que se confrontam com esta possibilidade. E são muitos. Cada vez mais em Portugal. Segundo Tiago Mesquita no blogue 100 Reféns do Expresso,

“O número de pessoas que deixaram de pagar os empréstimos bancários aumentou 450%. Repito: 450%.”

Talvez seja um número suficiente para tornar uma campanha de renovação de fachadas rentável. Talvez um dia destes um banco pegue na ideia, faça um consórcio com uma marca de tintas e uma empresa de construção civil falida e comece a pintar as fachadas de novo, incluindo a sua, com cores fortes e vibrantes que nos façam acreditar. De novo.

Cantar de Gallo

A ver se nos entendemos: falar uma mesma língua significa, mais que partilhar um idioma, estar em perfeita sintonia cultural.

A recente acusação de racismo de um anúncio do azeite Gallo no Brasil, despoletada por uma colunista da Folha de São Paulo e que deverá vir a ser avaliada pelo organismo de auto-regulação da publicidade do Brasil (CONAR), chama a atenção para um facto que é muitas vezes esquecido num mundo globalizado onde todos podemos e devemos falar uma mesma língua.

A ver se nos entendemos: falar uma mesma língua significa, mais que partilhar um idioma, estar em perfeita sintonia cultural com o local e o momento. Falar uma mesma língua implica ter sensibilidade para as idiossincrasias do meio ambiente comunicacional, seja ele institucional ou pessoal, implique ele um cidadão ou um país inteiro. Falar uma mesma língua é antes de mais nada respeitar e compreender o outro.

O que aconteceu com o Gallo brasileiro, criado pela AlmapBBDO, uma das mais premiadas dos últimos anos, é uma infelicidade comunicacional. É a prova de que o humor é uma arma poderosa mas difícil de manusear, que quando usada sem bom senso provoca danos colaterais e, no mínimo, um sorriso amarelo numa marca que nos habituou, pelo menos desde 1989, a alguns dos mais belos spots publicitários da portugalidade anunciando, mais do que um azeite premiado, a nossa própria alma.

A Gallo é líder em Portugal, com 30% da quota do mercado, é a quinta maior marca mundial e vende para 47 países. Recentemente fez um restyling da sua imagem para estar mais perto dos consumidores contemporâneos, reinventando a tradição e propõe-se vir a ser a terceira maior marca mundial de azeite.

“Eu gosto muito de ouvir cantar a quem aprendeu, se houvera quem me ensinara quem aprendia era eu.”

Desde 1919.

Salvar o negócio do jornalismo – dois exemplos

Ken Doctor escreve, por estes dias, uma série de textos no espaço do Nieman Journalism Lab sobre exemplos bem sucedidos de empresas jornalísticas europeias.
No primeiro post fala-se do sucesso do grupo finlandês Sanoma, dono do maior diário escandinavo e de dois portais informativos de grande popularidade. A sua operação online (de conteúdos fechados) tem a adesão de 130 mil subscritores (a um custo unitário de 36 euros são mais de 4,5 milhões por ano).
No segundo post, do grupo Schibsted, que tem já 36 por cento do total dos seus rendimentos a partir do online; a decisão estratégica fundamental foi tomadas em 1999 quando se optou por uma separação clara entre as operações online e papel e se investiu, de forma deliberada e autónoma, em conquistar o mercado dos pequenos anúncios na internet.

São textos produzidos para uma audiência norte-americana, mas há detalhes que podem servir de exemplo a operações nacionais e, sobretudo, que podem sinalizar a existência (sim, mesmo na atual conjuntura) de novas oportunidades de negócio para projetos inovadores.

‘Bora lá ser pobre?

SPENT parece o nome de uma série televisiva do tipo Lost ou Perdidos na Tribo. Embora a experiência nos possa deixar um pouco perdidos, trata-se de um jogo online que simula a sobrevivência com mil dólares por mês, nos Estados Unidos. Fosse em Portugal e esta quantia daria para muito mais, mas cá aplica-se aos novos e velhos pobres, aos assumidos e aos envergonhados, às mais de 31% de famílias, segundo uns, um quinto dos portugueses, segundo outros, que vivem no limiar da pobreza ou abaixo dele.          

SPENT faz parte de uma estratégia de comunicação que pretende chamar a atenção, receber donativos e envolver a sociedade e os membros do Congresso norte-americano —  a quem também foi lançado o desafio de jogarem — para o que acontece aos milhares de pessoas  normais (sim, pessoas como nós) que, subitamente ou num lento e devastador processo de agonia,  se tornam dependentes, desempregados, sem-abrigo e desesperados. Desgastados financeira e economicamente, agastados social e emocionalmente.

SPENT coloca-nos o desafio de viver na pele de um recém-desempregado com um filho, que tenta arranjar emprego e chegar ao fim do mês vivo. Pelo caminho há várias situações que simulam a vida real, como ter que alugar uma casa mais barata, escolher entre pagar a conta do gás ou da electricidade, entre explicações para o filho ou pagar o seguro do carro, ou entre aceitar um casaco em segunda mão ou a ajuda da caridade. Mas também somos obrigados a fazer escolhas de carácter moral ou emocional, como entregar ao dono uma nota que este deixou cair ou assumir os estragos de um toque no parque de estacionamento.

Criado a partir da realidade americana por quem sabe do que fala (parece que a criadora, Jenny Nicholson, copywriter, viveu uma vida de privações), patrocinado pela agência de publicidade McKinney e pelos Urban Ministries of Durham, uma organização não governamental privada que se assume como “A community of support united for the greater good of all”, o jogo  já foi jogado por mais de um milhão e meio de pessoas em 196 países e revela-se de uma enorme actualidade aqui e agora.

O seu senão é que a abordagem pseudo-lúdica à pobreza pode provocar o que a Technology Review chama “gamification of poverty”, fazendo parecer que esta é uma realidade distante, paralela ou meramente virtual, da qual nos podemos facilmente alhear. Basta não querer ver. Basta não jogar o jogo.

Se ainda não experimentou a sua capacidade de resiliência na vida real, teste-a aqui.

‘Petits-fours’

No rescaldo do fogo de artifício da abertura de Guimarães Capital Europeia da Cultura 2012 na qual não tive qualquer participação a não ser numa espreitadela fugaz à televisão, venho aqui dizer que também Eu faço parte!

E não é de agora. Na capa do livro da quarta classe, salvo erro, o Castelo de Guimarães representava uma realidade distante no tempo e no espaço, uma ligação às minhas raízes mais  remotas, construindo um sentimento de pertença anacrónico nas águas quentes de Pemba, candidata a mais bela baía do mundo.

Retirado do vídeo promocional Guimarães CEC 2012

Confesso que quando anos mais tarde visitei o castelo fiquei decepcionada por naquele monte de pedras em ruínas quase nada restar do castelo que eu tinha construído na minha imaginação, cheio de soldados de cota de malha espreitando nas ameias, comandados por um rei Afonso de coroa reluzente. Já era tarde demais para rever a história mas o castelo não perderia nenhum fulgor na memória afectiva que dele guardo.

Guimarães 2012 é um bom exemplo de um restyling de marketing territorial, ancorando-se numa janela-coração e na ideia de participação e envolvimento da população local para além dos vários públicos estratégicos. Não sei de quem partiu a ideia, se foi uma encomenda ou uma criação espontânea, mas quando vi o bolinho húngaro com a forma do logo da capital europeia, percebi que a aposta da comunicação estava ganha. Haverá melhor merchandising? A participação para dar voz à diversidade foi levada ao extremo e até se pode personalizar o logótipo. Crie aqui o seu.

Só quando nos apropriamos dos símbolos é que eles de facto nos representam e nos dias de hoje é fundamental comunicar olhos nos olhos, olhos no coração.

Guimarães, I lobe ya!

Obs: Bolinho-coração-logo gentilmente roubado a Paula Nogueira que atribui a autoria à “Pavico, uma empresa com história que se dedica a panificação, pastelaria e catering. Muito conhecida na cidade pelas coisas boas que produz mas também pelo arrojo de comunicação”. Ainda me prometeu uma caixa de bolinhos. A boa comunicação abre, de facto, novas possibilidades.

Vida de insecto

Flower Power

Se há coisa que a publicidade faz bem é retratar a nossa alma e acompanhar todos os momentos da nossa vida. Confortável e irritantemente omnívora. Irresistível.

O VW carocha surge em 2012 adaptado ao momento, como sempre fez, com este novo outdoor. Oferece-nos POWER, tira-nos FLOWER. A vida não está para menos mas apetece perguntar: Onde estão os hippies? E os yuppies? Que utopias nos restam a nós, breves insectos deste imenso universo?

A mensagem da flor riscada é a tradução do conceito exibido já no ano passado, na Super Bowl, o  21th Century Beetle.

Ecológicos e minúsculos, respirando as nossas vidas intensamente superficiais desaprendemos de sonhar. A Volkswagen – carro do povo –  recorda-nos dessa pulsão e dá-nos um empurrãozinho.

1964

1966 - Don't laugh.

1967

1968 Live below your means

Receita para os tempos que correm: viver abaixo das possibilidades.

O escaravelho tem sete vidas. Ou mais.

Imagem de abertura: www.ligateamedia.pt; Publicidade vintage: http://www.adclassix.com

Pingo Amargo

Está no nosso ADN. O Pingo Doce é uma marca portuguesa. E gostamos dela. Se não gostássemos, não nos importávamos. Mas a julgar pela proliferação de vozes críticas gostamos mesmo.

Começámos o namoro com anúncios-­poema de iluminação mística e voz colocada que transfiguravam uma vulgar truta de aquário num rodovalho requintado, posicionando-­‐se como uma cadeia de distribuição com um toque gourmet que nos dava a ilusão de uma vida mais bonita. Oficializámos a relação mais tarde quando o apelo à tradição veio acompanhado de uma descida de estatuto, tornando o sítio do costume um lugar mais popularucho, uma espécie de parque temático com sorrisos da charcutaria aos detergentes.
Não gostámos, criticámos a musiquinha irritante e semi-­pimba do venha cá até que ela começou a entrar no ouvido. E porque sabe bem pagar tão pouco, perdoámos e aproveitámos as promoções durante todo o ano, sem cartões nem complicações.
Estávamos nesta vidinha quando o parceiro com quem partilhávamos os nossos dias assumiu publicamente que afinal o que é nosso, o nosso azeite, o nosso vinho, o nosso pão com azeitonas, o nosso bacalhau da Noruega, enfim, o nosso amor por Portugal, tinha andado a fazer olhinhos a um sistema fiscal bem mais vantajoso.
Afinal não tínhamos casado para o melhor e para o pior? Não gostámos. Sentimos a facada nas costas. Menos de um ano depois de Soares dos Santos apelar a um governo de salvação nacional, procurava a sua e a nossa salvação numa relação extra-conjugal e explicava porquê num comunicado em que nos diz que nos ama desde 1792.

Comunicado Pingo Doce distribuído nas lojas em 5.1.12

Distribuído nas lojas perante a estupefacção de muitos dos consumidores que nem sequer tinham dado conta de qualquer tipo de polémica, tal como não se tinham apercebido da publicidade enganosa dos 0% de IVA no verão passado, o Pingo Doce assumia uma estratégia de comunicação de crise, comunicando para evitar outros protagonismos e mais ruído.
A traição poderá sido mais simbólica que real mas doeu. Gritámos: Podes ficar com a casa e o carro mas não me tires o carrinho de compras! Esperneámos e retaliámos com acusações anti-­patrióticas e boicotes. Alguns de nós foram até fazer compras à mercearia da esquina nessa semana. Só para aprenderem a não brincar com os nossos sentimentos e com a nossa fidelidade.
Mas porque as coisas não estão fáceis e o Cabaz Família nos dá 3kg de peixe congelado por 10 €, em breve a amargura deste amor corrompido dará lugar a um breve amuo. Até parece a letra de um fado, mas não é.

Entre raivas, apoios e indiferenças o Pingo Doce tem estado no centro dos argumentos esgrimidos contra e a favor, ganhando ainda mais tempo de antena. No fim da novela o que interessa é que o consumidor irá ao Pingo Doce enquanto isso lhe for favorável. E o consumidor está a aprender a fazer contas. As contas que lhe permitirão decidir pelo divórcio ou por manter um casamento de paixão morna com os habituais altos e baixos da conveniência.

O sapato de cristal da Cinderela poderá ser um clomp de madeira feito para turistas em Volendam e o melhor é pormo-­nos em cima dos tamancos e caminhar como se fossem stilettos.
Antes isso. Afinal já nascemos descalços. É bom que cada um de nós compare e comprove. Este é o pingo amargo-­doce de que se aprende a gostar.

Veja mais intervenções sobre esta relação de amor-ódio aqui e aqui.

Quase, quase jornalismo

Deverá estar amanhã nas bancas a segunda edição da revista do Expresso depois da sua mais recente mudança.

Correndo o risco de falar ainda ‘a quente’ diria que – a julgar pelo exemplar a que tivemos acesso na semana passada – estamos em presença de um produto informativo cuja razão de ser está cada vez mais distante do jornalismo e cada vez mais próxima dos universos da comunicação institucional e da publicidade.

É fácil perceber porque isto sucede – o mercado publicitário está em quebra e o grupo Impresa vive também momentos de fragilidade. A solução passa, aparentemente, por reformular um produto com preços de tabela altos (em termos nacionais) por forma a apelar a mais anunciantes, no maior número possível de segmentos. Sendo um produto-associado, a revista procura deliberadamente terrenos publicitários para além daqueles abrangidos pelos cadernos principal e de economia e ‘joga’ nos anunciantes que querem chegar a um público interessado numa versão upmarket da Caras.

Uma observação muito rápida do que nos foi oferecido permite anotar a presença de seis textos de opinião, cinco segmentos com algo que poderia ser designado como notas breves, outros cinco com citações / excertos / inquéritos, dois trabalhos de perfil, uma pré-publicação de um livro, três entrevistas (sendo que uma delas é com um famoso ator de cinema, sobre um filme que, páginas antes, aparece publicitado), dois (se adotarmos um entendimento lato do género) espaços de reportagem – um em que se promete ter um ‘intruso’ (anónimo) em festas, vernissages e happenings e um outro em que se leva alguém (famoso, presume-se) a uma passeata e disso se dá conta – e pelo menos sete áreas autónomas de divulgação e sugestão de produtos (desde os vinhos, às roupas em saldo, à dança de varão).

No video de apresentação da nova aposta do Expresso a editora, Mafalda Anjos, prometia, de facto, “mais energia positiva, mais otimismo“, num “produto mais leve” em que se notaria um “reforço de toda a componente de serviços“.

Há, neste exemplo, indicações que podem ser úteis para discutir o atual estado da imprensa em Portugal:

– A relação – sempre sensível e instável – entre os interesses jornalísticos e os interesses das áreas ligadas ao marketing e à publicidade na empresa  é tendencialmente menos de equilíbrio e mais de subjugação;

– A importação para o papel de lógicas de organização dos temas, do espaço gráfico e da própria escrita da internet – não estando ainda provado em lado algum do planeta que tenham funcionado – acrescenta complexidade e arrisca-se a tornar o produto físico ainda mais redundante;

– As opções estratégicas parecem basear-se nas ideias que, noutros mercados e há já mais tempo, levaram muitas publicações a um definhamento agoniante; dá-se às audiências cada vez menos – levezinho, fresquinho, ‘micro-formatos’, como diz a editora – presumindo que isso aumenta os níveis de fidelidade (lembra a história do burro que estava quase, quase a habituar-se a não comer…);

– As opções estratégicas parecem estar ancoradas na ideia de que, no essencial, o jornalismo é aborrecido; conseguimos tolerá-lo mas em doses reduzidas, tão depuradas, tão estilizadas, tão bem paginadas que se confundem facilmente com a ‘energia positiva’.

O Expresso não é – longe disso – caso único, mas sinaliza o domínio absoluto de uma tendência de gestão muito limitada e sem horizontes que está a marcar, de forma decisiva, o jornalismo nacional.

Dir-se-á, com razão, “quando até o Expresso”…

Na web (também) vale a pena?

Percebi, esta tarde, que os sites de alguns dos principais títulos jornalísticos nacionais vestiam a cor de uma conhecida marca de supermercados.
Numa rápida verificação dei conta (por volta das 15h30) de que num universo de 13 ‘títulos’ foram sete os que concordaram com a proposta, dois deles – a TVI e o Público – aceitando não apenas preencher a tradicional ‘moldura’ a branco com a dita promoção mas ainda a inclusão dos tão populares pop-ups (no caso do site do Público percebe-se ainda, num cantinho, o tal do ‘P’ mas no caso da TVI até a identificação do canal desaparece).

Sendo estes tempos de crise generalizada seria despropositado não aceitar as razões pode detrás desta cedência. Creio, aliás, que nos casos em que não há interferência directa com os conteúdos informativos estamos perante algo que os jornais em papel já fazem, um pouco por todo o mundo, há alguns anos (PS2 – 16h50 – a referida marca optou também hoje por fazê-lo).
Nos outros – o Público e a TVI – parece-me, porém, que se dá um passo a mais.
A nota de relevo é, ainda assim, o facto de uma grande marca acreditar que faz sentido investir desta forma nos espaços informativos online. Há uns anos atrás, quando uma operadora de comunicações móveis decidiu promover a sua mudança de imagem colorindo de azul as capas de alguns dos principais jornais escolheu não apostar na web (mais aqui e aqui). Agora, aparentemente, as coisas já mudaram.

PS1 – 16h05 – Para que conste, Diário Económico e Jornal de Negócios também aderiram à campanha.

O DN e a BP

Esta manhã recebi o DN gratuitamente num posto de abastecimento da BP, coisa que já me havia acontecido antes. Porém, hoje a mancha verde e amarela da BP na capa do DN era particularmente evidente, ao ponto de ter chegado a confundir esta primeira página com as capas publicitárias que às vezes se sobrepõem à edição jornalística. Para além de a principal imagem da página chamar para uma notícia referente à petrolífera na página 24 e de uma caixinha publicitária chamar para a página 11, com indicação de um «desconto que é notícia» (ver caixas amarelas indicadas na imagem acima), a edição que me ofereceram tem ainda do lado esquerdo a indicação ‘Oferta BP Premierplus’. Coincidências?

“Os novos territórios da Publicidade”

O GT de Publicidade e Comunicação da SOPCOM (Associação Portuguesa de Ciências da Comunicação) promove durante todo o dia de amanhã, em Braga, as suas IV Jornadas, em torno do tema “Os novos territórios da publicidade”.
Jornadas Pub
A iniciativa, organizada desta vez pela Universidade do Minho, através do Departamento de Ciências da Comunicação e do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade, tem lugar no Complexo Pedagógico II do Campus de Gualtar. Será ocasião para premiar trabalhos de estudantes da especialidade, que foram convidados através de um concurso a preparar projectos no quadro do “marketing de guerrilha”.
O programa pode ser consultado AQUI.