Por um ‘jornalismo de escuta’

“Jornalismo, crises e Democracia” é o lema da conferência nacional de jornalistas que se realiza no próximo dia 24, em Lisboa, por iniciativa do Sindicato representativo deste grupo profissional.

O debate sobre o sector e “as formas de intervenção nas redacções e na sociedade” são objectivos da Conferência que pretende ser também um “passo” para o 4.º Congresso dos Jornalistas Portugueses.
Os jornalistas têm motivos de sobra para se reunirem e reflectirem entre si, certamente. Com as gigantescas transformações que estão à vista devem ser o único grupo profissional que não reúne vai para década e meia. Cobrindo congressos de todos os outros organismos, não conseguiu arranjar tempo e motivação para ser ele próprio e o seu papel na sociedade motivo de encontro. Só isso já diz bastante das dificuldades e contradições que se foram agudizando no seu seio e nos contextos organizacionais em que exerce o metier.
Mas, dito isto, e correndo o risco de parecer contraditório, acrescentaria que os jornalistas não vencerão os impasses e desafios com que se deparam se pretenderem enfrentá-los sozinhos. Mais do que no passado, o jornalismo encontra-se hoje no epicentro de um ciclone que afeta não apenas as redacções e grupos de media, ainda que de forma diferenciada, mas o próprio regime democrático, sentido primeiro e último do próprio jornalismo.
Parece-me vital que a profissão se abra aos contributos de todos os sectores da sociedade que também estão seriamente preocupados com o futuro do jornalismo – associações e movimentos culturais, sociais e políticos, alguns setores da economia, centros de investigação e ensino, entre outros. Como poderão os jornalistas e suas associações (e não apenas o seu sindicato) servir melhor a sociedade se não se puserem à escuta do que esperam os cidadãos e do que estes podem dar?
Temo que se a Conferência Nacional que se avizinha for mais um momento para as lamentações do costume ou para “explicar à sociedade” os problemas da profissão será pouco mais do que tempo perdido. A profissão estiolará se se autocentrar e se puser a falar para si mesma. Poderá redescobrir-se e fortificar-se se for inovadora no modo de enfrentar as dificuldades. E isso passa por escutar mais os anseios, lutas, contributos e esperanças que germinam na sociedade e que são frequentemente silenciados no espaço público.

(Texto publicado no Página 1, da Renascença, em 12.11.2012)

Um Dia com os Média

Convocar os cidadãos e a sociedade para refletir sobre os papel e o lugar dos media nas suas vidas é o objetivo da Operação Um dia com os Media, projeto que irá decorrer no próximo dia 3 de maio, dia mundial da liberdade de imprensa, com múltiplas iniciativas por todo o país.
Esta Operação surge num tempo em que as tecnologias e plataformas digitais permitem, como nunca, que os cidadãos se exprimam no espaço público, fazendo por isso sentido que o olhar crítico e participativo relativamente aos media seja, ele próprio, um exercício de liberdade.

Promovida pelo Grupo Informal sobre Literacia para os Media, esta operação congregará um vasto e variado conjunto de atividades concebidas e realizadas pelas mais diversas instituições, tais como bibliotecas, meios de comunicação, escolas, instituições do ensino superior, grupos de alunos, centros de investigação e formação, associações, universidades de seniores, movimentos, igrejas, autarquias e outras, glosarão o mote Um dia com os media: Que significado têm os media na nossa vida e como poderiam tornar-se mais relevantes?
São diversas as ações programadas, como sejam, programas de rádio e televisão, conferências, mostras, concertos, debates, projeção de filmes, concursos escolares, ações de formação, jogo lúdicos, ações de rua, entre outras.
A lista completa de ações pode ser consultada AQUI.

Toda a informação sobre a Operação pode ser encontrada AQUI.

Grupo Informal sobre Literacia para os Media

O Grupo Informal sobre Literacia para os Media é uma plataforma que reúne entidades públicas com missões no domínio da literacia para os media, sendo presentemente constituído por: Comissão Nacional da UNESCO, Conselho Nacional de Educação, Entidade Reguladora para a Comunicação Social, Gabinete para os Meios de Comunicação Social (GMCS) e Universidade do Minho – Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade.
Entre os muitos projetos desenvolvidos pelo Grupo, importa destacar o Portal da Literacia para os Media e o Congresso “Literacia, Media e Cidadania”, do qual resultou a “Declaração de Braga”.

O jornalismo ‘capturado’ – o caso da TDT

(No seguimento do post do Sérgio Denicoli)

O fim da televisão analógica é hoje assinalado com o desligar dos últimos 15 emissores. A autoridade que regula as telecomunicações, a Anacom, diz ter-se tratado de uma transição sem problemas, sendo que, nesta altura, quem se atrasou na mudança agiu com total conhecimento das consequências.
Muito podia ser escrito sobre esta atitude ‘se quiserem comam, se não quiserem ponham na borda’ de uma entidade pública que tem por missão assegurar a defesa dos interesses dos cidadãos mas este post surge por uma outra razão – o jornalismo que se faz (e fez) sobre este assunto de vital importância (sobretudo) para os mais frágeis na sociedade foi, salvo honrosas exceções (e importará aqui salientar o trabalho desenvolvido por alguns profissionais na RTP – Porto), de muito má qualidade.
Foi um jornalismo ‘repetidor’, um jornalismo ‘pé de microfone’, um jornalismo que semanalmente deu conta do ‘sucesso’ de uma transição cheia de problemas, porque pouco mais fez do que transcrever (sim, transcrever, em muitos casos, na íntegra) o que era dito pela Anacom nos seus comunicados.
Este jornalismo acomodado, este jornalismo ‘não me chateiem que eu já tenho problemas que cheguem’, que se percebe na notícia difundida esta manhã pela Lusa, descurou a complexidade social do assunto.
É um jornalismo pobre, descuidado e desinteressado.
Não nos serviu, enquanto comunidade.

No portal informativo do SAPO (propriedade da PT) temos esta manhã em destaque a notícia da Lusa (agregada na área temática ‘Tecnologia e Ciência’ e com base nas declarações da Anacom) mesmo ao lado de um anúncio da Meo (propriedade da PT) que nos avisa: ‘Prepare-se para a TDT‘. Se lá fizermos o clique vamos para uma página nova com as ‘soluções PT’.
Um leitor pouco atento podia até ser levado a pensar que o ‘problema’ TDT se resolve com a ajuda amiga da PT.
E, provavelmente, esse leitor desatento estará mais próximo da verdade do que imagina.
O ‘problema’ TDT ‘resolveu-se’ com a conivência dos operadores de televisão, com a anuência de dois governos, com a ‘certificação técnica’ da Anacom, com o desinteresse de um jornalismo tendencialmente amorfo e para benefício das atividades de TV por cabo.
Nâo ficou ninguém de fora, pois não?

Como dar sentido ao jornalismo?

Analisar o presente e o futuro do jornalismo nas sociedades contemporâneas é o propósito essencial de um debate que terá lugar no próximo dia 17 de Abril (terça-feira), às 14h30, no Auditório do Instituto de Educação (IE) da Universidade do Minho (UM), em Braga.

Subordinado ao tema “Como dar sentido ao Jornalismo?”, o debate procura juntar jornalistas, investigadores, docentes e estudantes de jornalismo, bem como cidadãos interessados, qualquer que seja a sua proveniência. A iniciativa, semelhante a outras que se têm realizado em diversas universidades do país, culminará com a elaboração de uma Carta de Princípios do Jornalismo em Portugal, assente nos diferentes contributos e reflexões recolhidos.

O debate na Universidade do Minho / Braga decorre no âmbito das jornadas anuais do Grupo de Alunos de Ciências da Comunicação (GACCUM) e contará com as participações de Adelino Gomes (jornalista), Gustavo Cardoso (investigador), Carlos Daniel (jornalista), Isabel Margarida Duarte (professora universitária) e João Gonçalves (estudante de jornalismo), além de docentes de Jornalismo da própria UM – Joaquim Fidalgo, Luís António Santos e Manuel Pinto.

Esta realização inscreve-se num projecto mais vasto, intitulado “Projecto Jornalismo e Sociedade” (PJS), lançado por uma equipa de investigação do CIES-IUL – Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do ISCTE-IUL, Instituto Universitário de Lisboa, e que conta com os apoios das Fundações Gulbenkian, EDP e FLAD. Coordenado por Gustavo Cardoso (presidente do Obercom) e Adelino Gomes (jornalista), o projecto congrega, no seu Conselho Consultivo, representantes das principais universidades portuguesas onde se ensina Jornalismo e dos mais relevantes órgãos de Comunicação Social nacionais.

Aberto à participação de todos os interessados, este debate é uma organização conjunta do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade (CECS) – Instituto de Ciências Sociais (ICS), e do Grupo de Alunos de Ciências da Comunicação (GACCUM) da Universidade do Minho.

O Fórum poderá também ser acompanhado à distância: através do browser ou  através de um media player.

“Explicar um blog não era fácil”

Depoimento de Elisabete Barbosa, Diretora de Comunicação e Projetos, uma das fundadoras do blog:

Criar e manter um blog há 10 anos atrás era uma tarefa bastante mais difícil do que é hoje. Não existiam os serviços atuais, não era possível utilizar imagens facilmente e os sistemas de comentários tinham que ser integrados no blog (pelo menos para os utilizadores do Blogger).
Mas também era mais interessante e divertido. Conhecia-se toda a blogosfera portuguesa e ainda era possível acompanhar facilmente o movimento nos EUA e no Brasil. Cada novo blog português era celebrado por toda a comunidade e as notícias sobre cada “nascimento” entusiasticamente divulgadas por outros bloggers.
Estejam ou não moribundos, os blogs foram percursores importantes do atual panorama das redes sociais. Foram os primeiros sistemas de auto-publicação, um grande passo para a democratização da Internet, o momento em que deixou de ser necessário conhecer linguagens de programação para poder publicar.
Para mim, no entanto, a principal diferença entre manter um blog hoje e há 10 anos não está na tecnologia ou no conhecimento do meio. Reside no facto de, atualmente, não ser necessário estar constantemente a explicar o que é um blog. É que não era fácil.
Parabéns ao Jornalismo e Comunicação e a toda a equipa.

A Rádio na frequência da Web

Está já disponível o vol.20 (2011) da revista Comunicação e Sociedade, recolhendo textos em torno do futuro da rádio em ambiente digital.
Madalena Oliveira e Pedro Portela, os organizadores deste número, dizem no seu texto de apresentação:
Repensar a rádio no actual contexto de uma sociedade digital, ou mais especificamente no contexto da web, impõe que se repense a sua relação com a imagem, mas também, de um modo mais generalizado, os termos do seu contrato de escuta. Se é verdade que a emissão tradicional se mantém de alguma maneira na web – que nessa medida é apenas um novo dispositivo de escuta, um novo receptor do sinal radiofónico -, também o é que a oferta associada aos sítios das emissoras na Internet exige uma redefinição da sua relação com os ouvintes.
Mais detalhes aqui (esclarecimentos e encomendas através deste endereço)

Salvar o negócio do jornalismo – dois exemplos

Ken Doctor escreve, por estes dias, uma série de textos no espaço do Nieman Journalism Lab sobre exemplos bem sucedidos de empresas jornalísticas europeias.
No primeiro post fala-se do sucesso do grupo finlandês Sanoma, dono do maior diário escandinavo e de dois portais informativos de grande popularidade. A sua operação online (de conteúdos fechados) tem a adesão de 130 mil subscritores (a um custo unitário de 36 euros são mais de 4,5 milhões por ano).
No segundo post, do grupo Schibsted, que tem já 36 por cento do total dos seus rendimentos a partir do online; a decisão estratégica fundamental foi tomadas em 1999 quando se optou por uma separação clara entre as operações online e papel e se investiu, de forma deliberada e autónoma, em conquistar o mercado dos pequenos anúncios na internet.

São textos produzidos para uma audiência norte-americana, mas há detalhes que podem servir de exemplo a operações nacionais e, sobretudo, que podem sinalizar a existência (sim, mesmo na atual conjuntura) de novas oportunidades de negócio para projetos inovadores.

Motivos para a Anacom ser investigada pela Assembleia da República

Na última terca-feira, tive a oportunidade de participar de um simpósio na Assembleia da República e pedir aos deputados integrantes da Comissão para a Ética a Cidadania e a Comunicação, que propusessem a instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), para investigar a fundo o papel do regulador no caso da implementação da TDT no país.

Não o fiz sem bases. Ao constatar que há indícios de que a Anacom não vem cumprindo a Lei das Comunicações Eletrónicas, que é a legislação que rege o direito de utilização de frequências concedido à Portugal Telecom para a exploração da TDT (Artigo 2º do título habilitante disponível aqui), sugeri aos parlamentares que cumprissem a função que têm enquanto fiscalizadores do sistema democrático, de forma a averiguar se há realmente um desvio do que deveria ser o papel do regulador.

Os indícios que apontei foram os seguintes:

De acordo com  Lei nº5/2004, de 10 de fevereiro, Lei das Comunicações Eletrónicas, as funções da Autoridade Reguladora Nacional, a ANACOM são:

  • “Defender os interesses dos cidadãos”.
  • “Assegurar a inexistência de distorções ou entraves à concorrência no setor das comunicações electrónicas”.
  • “Assegurar um elevado nível de protecção dos consumidores, do seu relacionamento com as empresas que prestam serviços de comunicações electrónicas.
  • “Promover a prestação de informações claras, exigindo, especialmente, transparência nas condições de utilização dos serviços de comunicação acessíveis ao público”.

Em relação à defesa dos direitos dos cidadãos, cabe à Anacom garantir a difusão de informação credível sobre a TDT, que não confunda os cidadãos. No entanto, jamais uma empresa foi punida por publicidade duvidosa, e estão a ser veiculadas peças publicitárias que utilizam a TDT como fator para impulsionar a venda de pacotes de TV paga, conforme os exemplos a seguir:

Imagem

Em relação à necessidade da Anacom de “Assegurar a inexistência de distorções ou entraves à concorrência no setor das comunicações eletrónicas”, cabe lembrar que:

A PT tinha uma cobertura analógica que chegava a 98% da população. Um decreto-lei obrigava os operadores a garantirem uma cobertura de pelo menos 95% da população.

O título dado à PT obriga a empresa a cobrir 90,12% da população continental, 87% nos Açores e 85% na Madeira.

A Anacom, em 7 de Abril de 2011, publicou uma deliberação que redefiniu a comparticipação nas zonas de sombra, modificando o Artigo 9º do título dado à PT para a utilização de frequências, que dizia ser obrigação da PT arcar com todos os custos referentes à recepção do sinal nas zonas de sombra.

—A Lei das Comunicação Electrónicas diz, em seu artigo 8º: “Sempre que, no exercício das competências previstas na presente lei, a ARN pretenda adoptar medidas com impacte significativo no mercado em causa, deve publicitar o respectivo projecto, dando aos interessados a possibilidade de se pronunciarem em prazo fixado para o efeito, o qual não pode ser inferior a 20 dias.”.Apesar da alteração promovida pela Anacom refletir na vida de mais de 1 milhão de portugueses, a mudança não foi submetida a concurso público, sendo definida após uma reunião com a Portugal Telecom, conforme diz a própria deliberação de 7 de Abril de 2011.

A Anacom tem feito reuniões com autarcas para discutir a redução das zonas de sombra. No entanto, jamais foi revelado os custos dessas operações, apesar do Deputado Bruno dias ter afirmado que em Vouzela foram pedidos 90 mil euros para a instalação de três repetidores. Em Espanha, qualquer empresa pode fazer este serviço que, em Portugal, tornou-se um monopólio da PT.

No caso das zonas de sombra, a venda do equipamento também é monopólio da PT (segundo a Anacom por questões de segurança) e permite o visionamento apenas dos  4 canais generalistas. Engenheiros dizem que a segurança está no cartão que é inserido no descodificador e não no próprio aparelho. A Lei das Comunicações Electrónicas diz o seguinte (Artigo 103): “Os equipamento de consumo destinados à recepção de sinais de televisão digital devem possuir capacidade para: reproduzir sinais que tenham sido transmitidos sem codificação”.  É preciso ressaltar que, com o equipamento DHT pode-se receber dezenas de canais livres transmitidos sem codificação por satélite. Mas não com o kit vendido exclusivamente pela PT.

Em relação à função da Anacom de “Assegurar um elevado nível de proteção dos consumidores, do seu relacionamento com as empresas que serviços de comunicação eletrónicas”, republico aqui o título de uma notícia divulgada pelos média este mês: “Dezenas de habitantes de uma aldeia de Mirandela garantem que foram enganados por agentes da MEO. Terão convencido mais de metade da povoação a aderir à televisão por cabo dizendo que seria a única forma de terem a Televisão Digital Terrestre.” TSF, janeiro de 2012. Não foram tomadas providências por parte do regulador.

A Anacom tem ainda a função de “Promover a prestação de informações claras, exigindo, especialmente, transparência nas condições de utilização dos serviços de comunicação acessíveis ao público”, no entanto:

A Anacom sempre ressalta que os valores despendidos pelos cidadãos nas zonas de sombra são os mesmos das zonas cobertas pela TDT. No entanto isto não é verdade, como todos sabemos.

A Anacom diz em suas campanhas que “quem tem TV paga não precisa migrar para a TDT”. Isto também não condiz com a realidade, pois muitas casas possuem uma televisão onde recebe a plataforma paga e outras televisões que recebem o sinal por via terrestre.

A Anacom jamais explicou detalhadamente em suas campanhas nos média como os cidadãos devem obter os subsídios para a compra dos descodificadores.

Portanto, foi diante dos factos relatados acima, que fiz o apelo para a instauração de uma CPI.

Porque se gere ainda o conhecimento numa lógica de escassez?

A publicação de trabalhos académicos em revistas avaliadas por pares e listadas de acordo com fatores de impacto que não são claros, que privilegiam substancialmente algumas áreas específicas e que permanecem, no essencial, inalterados há muitos anos está a ser, cada vez mais, entendida por um número alargado de académicos como um impedimento ao avanço do conhecimento.
Há quem argumente que uma circularidade maligna impera: desde que os grandes journals – já dificilmente acessíveis a não fluentes em inglês, sobretudo em áreas para além das chamadas ciências exatas –  passaram a integrar listas ordenadas de ‘valia acrescida’ usadas por quem avalia carreiras académicas individuais e coletivas tornaram-se ainda mais inacessíveis, com um poder nada saudável de decisão sobre o que é ou não relevante.
Estes journals – e, como se mostrou aqui há dias, alguns deles estão longe de ter comportamentos eticamente aceitáveis – são praticamente ‘donos’ do conhecimento científico (PS, em 29.01: E querem solidificar ainda mais esse seu poder, forçando a aprovação de leis que lhes garantam rendimentos diretos a partir de fundos estatais).
Por estranho que pareça esta é a realidade em 2012, num tempo em que a web é já um espaço maduro de oportunidade para a disseminação de conhecimento.
O que impede as mudanças?
Entre as razões significativas, a fraca adesão da generalidade dos académicos a projetos ‘abertos’ e, sobretudo, a anacrónica lógica de avaliação imposta pelas entidades que contabilizam (o processo é cada vez mais quantitativo – como se de ‘produção de sapatos’ se tratasse) o que é feito.

Vem toda esta conversa a propósito de três posts de Doug Belshaw cuja leitura recomendo: Um, Dois, Três.

De um deles retiro, com a devida vénia, uma citação de Zygmunt Bauman:

To find a new enlightening and inspiring idea (as distinct from finding a recipe for getting safely through the peer-built barricade), browsing through thousands of journal pages is all too often called for. With my tongue in one cheek only, I’d suggest that were our Palaeolithic ancestors to discover the peer-review dredger, we would still be sitting in caves…

TDT: quem parte e reparte…não é tolo e tem arte

A TSF noticia hoje que por causa da transição para a televisão digital terrestre uma aldeia transmontana foi ludibriada por revendedores da MEO (PT); os habitantes ou subscreviam o produto ou ficavam sem nada. E lá subscreveram, em contratos que os vincularam a dois anos de pagamentos (a notícia da TSF foi atualizada e passou a incluír a reportagem audio; reportagens video foram posteriormente apresentadas na RTP e na SIC).
Ontem, o Público dizia-nos que os habitantes de uma aldeia de Mochique estavam revoltados com a perda de qualidade no serviço de televisão a que acedem.
Percebe-se que a gestão das obrigações do prestador de serviço em termos de cobertura não foi decidida pela entidade reguladora; foi decidida pela regulado, em claro desfavor dos mais frágeis.
Falhando a cobertura, ter-se-á pensado, lá estará o ‘marketing agressivo’ de alguns revendedores de TV por cabo para ‘resolver’ a situação.

Perante um processo de transição cheio de falhas gravíssimas, a ANACOM lá vai tentando fazer passar, junto de quem anda distraído, um cenário de normalidade num quadro que de imediato nos faz lembrar as prestações de Muhammed Saeed al-Sahaf, o ex-ministro da Informação de Saddam Hussein.

Há instantes, no Facebook, Luís Miguel Loureiro comentava a notícia difundida pela TSF assim:
Na TDT, o comando está a ser Meo… Porque, bem vistas as coisas, a TDT é uma boa (a melhor) Zon para passarmos a ser, num ápice, o povo “mais rico” da Europa no que toca a ligar o ecrã lá da sala…
E pensar que este é o mesmo povo que, em vez de reclamar por uma TDT gratuita com dezenas de canais nacionais, regionais e locais, como toda a Europa tem, prefere reclamar contra o serviço público de Televisão mais barato do continente europeu e aceita sem duvidar todas as mentiras que são postas a circular sobre os custos do mesmo…

Leituras

“If newspapers are no longer printed, the journalistic profession will change dramatically, and not necessarily for the better.”

“Dentro de 10 años solo leeremos en tabletas. Comprar un periódico o una revista en papel se verá como una experiencia retro, casi de lujo.”

Novos mercados, novos negócios…

Recentemente, acontecimentos estranhos (no mínimo estranhos) têm redimensionado (para não dizer virado de pernas para o ar) aquilo que é a concepção de fazer ciência. De fazer ciência com dignidade, com mérito transparente. E isto porque parece estar a surgir um novo negócio, extremamente lucrativo e engenhoso… Falo das publicações PAGAS em revistas científicas internacionais…

Tem sido prática, pelo menos de forma mais visível nos últimos meses, o editor da revista congratular o autor pela aceitação da publicação e anexar na simpática mensagem o formulário com a revisão de pares e com os devidos comentários (em pinceladas muito largas, diga-se, uns “peer review comments” muito genéricos) para enriquecer o texto para publicação. Ora, acontece que à 3ª ou 4ª mensagem de correio electrónico trocada lá vem o SE. No caso, o pagamento de uma certa quantia monetária por cada página do artigo…  Assim: “The flat price is $50 US dollar per page”. Por página, a multiplicar por cerca de 20 páginas, a dividir pelo número de autores… Ah, então afinal até parece que nem dá muito a cada um! Ironia, claro está.

Falo da David Publishing Company, mais concretamente da revista Journalism and Mass Communication, mas apenas com o objectivo de ilustrar o que parece ser um novo negócio neste mercado das ideias e de o usar como mote para a discussão. A “ciência sem consciência” de que fala Rabelais parece encontrar aqui um excelente porto de abrigo.

Um negócio no mercado das ideias e uma reformulação da noção de ciência estão, assim, na base de estratégias como esta. Um novo modelo de negócio, dirão!

Mas este exemplo não termina aqui. Após pesquisa sobre as características da revista (indexação, factor de impacto, etc…), descobrem-se na blogosfera diversas críticas e relatos de más experiências com a revista ou com a editora (aqui, aqui ou aqui). Descobre-se, ainda, que há já quem discuta o assunto (nomeadamente aqui e aqui) e há inclusivamente listas daquilo a que chamam “Predatory Open-Access Publishers” e comentários que se referem a esta prática como um acto fraudulento (como aqui, aqui, aqui ou aqui). Estas referências são das mais variadas áreas científicas, não apenas das Ciências Sociais, o que denota alguma sensibilidade para o assunto e uma reacção por parte da comunidade científica.

Segue novo e-mail da parte dos autores. “Obrigada pela oportunidade mas a decisão é pela não publicação”… E eis que a resposta é inédita! Já passam a prescindir do pagamento da dita “fee” e acrescentam:

Maybe there is a misunderstanding.
Our editors, reviewers and authors are from all over the world,
and we try our best to provide a platform for experts and scholars
worldwide to exchange their latest findings.
However,to be honest, our journal just began,
it is very new and there is no sponsor for us,
so we have to charge some fees to run our journal.
Please understand that and support us. Thanks a million!

Milhões – e milhões de tudo, não apenas de dólares  – são o que estará em causa em situações como esta, nas quais se inverte completamente o processo produtivo… Em que se pede o pagamento de quantias para publicar trabalho digno e esforçado, em que não se sabe bem que implicações terá isso… Será bom? Será mau? Um novo modelo de negócio? Válido não é de certeza, a meu ver. Pelo menos não nestes moldes.

A rede que nos liga…e nos anestesia

No início da década de 70 do século passado, Gil Scott-Heron (desaparecido em 2011), por muito considerado o ‘pai do Rap’, dizia-nos num poderoso poema que a revolução não passaria na televisão…ela aconteceria ao vivo.

Excerto:
You will not be able to stay home, brother.
You will not be able to plug in, turn on and cop out.
You will not be able to lose yourself on skag and skip,
Skip out for beer during commercials,
Because the revolution will not be televised.”

O texto insurgia-se contra uma TV conservadora, em conluio com o sistema político e alheia aos sérios problemas que enfrentava a comunidade negra nos Estados Unidos.

Mais de 40 anos depois verificamos que tudo (o real e o simulado, como dizia ontem o Luís Miguel Loureiro) parece acontecer ao vivo.
E, naturalmente, com consequências.
Vale a pena perder cinco minutos com a apropriação/adaptação que Ronnie Butler Jr. (o homem que já nos tinha dado em 2010 um outro brilhante momento) faz do poema de Heron.

O ritmo da TDT na Europa

A “Notícias TV” desta semana faz um mapeamento da TDT na Europa e dos diferentes ritmos a que vários países  andaram (ou andam), não só no que diz respeito ao arranque deste processo de transição, mas também relativamente ao ano do switch off analógico. Percebe-se claramente um arrastamento, havendo países (como o Reino Unido) que arrancaram com o processo de implementação da TDT há mais de uma década… Outros, como a Suécia, contam menos do que isso desde o arranque à implementação.

In “Notícias TV” n.º 208 (de 6 a 12 de Janeiro de 2012), páginas 14 e 15

Leia-se, também, a nota introdutória que arruma Portugal para os últimos lugares europeus na transição do sinal analógico para o digital e, mais, que lhe atribui o “inovador” feito de manter a oferta de quatro canais televisivos: “Dos pioneiros holandeses, luxemburgueses e alemães, até aos demorados processos ingleses ou espanhóis, a experiência portuguesa é uma das últimas a ter lugar. Porém, Portugal contraria em absoluto o que sucedeu noutros países: é a única que não oferece nem mais um canal aos quatro que já existem”.

Quem é dono do quê?

A paisagem mediática nacional está em estado de grande fluidez – talvez seja o normal em tempos de crise, ou talvez não.
Parece, em todo o caso, que o ‘assunto’ da propriedada dos média portugueses deveria ser mais discutido (nos próprios média mas também fora deles).
Regista-se com agrado a atenção da Estrela Serrano ao tema – aqui e aqui, por exemplo – mas as movimentações ocorridas nos últimos tempos e, sobretudo, as que parecem estar ainda em curso talvez necessitassem de maior visibilidade.
Duas notinhas recolhidas hoje, a este propósito, não presumindo que uma possa ter algo a ver com a outra: o FC Porto pode estar a preparar-se para lançar um grupo de média e o Público anuncia novo plano de corte na despesa.