Sobre o silêncio dos media

A pequena coluna que quinzenalmente publico no Página 1, da Renascença, é hoje dedicado àqueles assuntos de potencial interesse público – e são muitos – e àquelas pessoas e grupos – e também são numerosos – que raramente ou nunca se ouvem, vêem ou lêem nas notícias.

Nunca chegaremos a avaliar em toda a sua extensão a dimensão desse silêncio mediático e noticioso e o seu efeito sobre o que sabemos e o que fazemos, baseados no que nos dizem e nos oferecem. Mas é claro que dizer isto não pode ser outra coisa que não um apelo a olhar para esse continente – gosto de lhe chamar “noite social”. Apelo dirigido aos jornalistas, certamente, visto que lhes cabe um papel crucial nessa matéria; mas dirigido também a todos nós, que contactamos com esse lado nocturno, porventura somos mesmo habitantes desse continente, e nos calamos, agravando, com esse silêncio, o silêncio institucional e público.

Dos últimos dias, dois casos (nem sequer dos mais sintomáticos, longe disso) que não passaram pelas notícias e que, a meu ver deveriam ter passado: a morte de Rui Polónio Sampaio, advogado do Porto que foi, ao longo de décadas, antes e depois do 25 de Abril, uma figura cívica de incontornável dimensão; e também a morte de Edward Schillebeckx, um dos maiores teólogos do século XX, marcante durante e após o Concílio, incomodado pelo Vaticano, defensor de uma visão do papel da Igreja que, em muitos aspectos, colide com a orientação hoje reinante. Ninguém deu conta; ninguém achou importante. Meros critérios editoriais? Generalizados?

Revistas on-line

“Clube de Jornalistas” na RTP chegou ao fim

Por uma série de afazeres prioritários, não me dei conta de que o programa “Clube de Jornalistas”, na RTP2, terminou. Acabo de ver a notícia no site do Clube. E, naturalmente, lamento a decisão e não fico tranquilo com o silêncio dos media sobre o assunto, em particular o silêncio da própria RTP. Não me dei conta de que o assunto tenha sido noticiado.
O programa surgiu no quadro do projecto do então ministro Morais Sarmento de abrir o segundo canal público à sociedade civil e, desde então, foram emitidos 197 programas, por onde, segundo dados do Clube, passaram mais de 500 convidados e foram divulgados outros tantos depoimentos.
O fim do Clube de Jornalistas na RTP é, afinal, mais uma manifestação de um quadro preocupante: os media -e a televisão em especial – têm dificuldade de se discutir em público. E mais ainda quando se trata do jornalismo. Por isso, e apesar de todas as críticas que se possam fazer ao programa que ia para o ar já perto da meia noite, ele constituía um espaço de reflexão importante e praticamente único.
A RTP, a quem cabem especiais responsabilidades nesta matéria, não pode limitar-se a retirar o “Clube de Jornalistas” da grelha de programação. A cidadania e a qualidade de vida democrática levam-nos a exigir que a perspectiva do exame crítico da acção dos media e do jornalismo prossigam, desejavelmente em programa com formato mais ambicioso e dinâmico e em horário mais razoável.

Entretanto, fica aqui o link para o vídeo da última edição.

Jornalismo e liberdade – Murdoch dixit

O texto de opinião que o magnate global do sector dos media Rupert Murdoch assina hoje no The Wall Street Journal, intitulado “Jornalism and Freedom” merece ser lido e estudando com atenção.
Por formação, gosto de ler e de acompanhar ideias bem argumentadas mesmo (ou sobretudo) quando são diferentes das minhas. Há sempre algo (às vezes, muito) que se aprende adoptando esse tipo de abordagem.
Ao contrário do que a frase do artigo destacada dá a entender – “Government assistance is a greater threat to the press than any new technology” – as opiniões de Murdoch vão para lá do problema dos subsídios estatais aos media e retomam posições veementemente defendidas nas últimas semanas relativamente ao modo de enfrentar a crise dos media jornalísticos e, em certa medida, da crise do próprio jornalismo.
Duas notas breves, a propósito:
1. Aparentemente a razão primeira da crise dos meios jornalísticos estaria em que não dão às pessoas aquilo que elas querem. Sublinha o auto que visitou inúmeros jornais cheios de prémios nas paredes mas com a circulação a cair a pique e isto porque os respectivos editores se esqueceram dos clientes e passaram a escrever e publicar para si mesmos.
A bem dizer, este argumento não é novo. Mas quando esperávamos que o autor abrisse uma nesga de solução para este problema, ele avança com os gadgets através dos quais os cidadãos acedem cada vez mais às notícias, nomeadamente os portáteis. Ora isto, se bem leio, não tem que ver com as notícias que interessam ou não, mas com o modo como a elas se acede.
Ou talvez não. Visto que a tecnologia através da qual lemos as notícias também pode ser altamente condicionadora do tipo de notícias que lemos.
Ora o articulista passa, neste ponto, para aquilo que designa por “qualidade do jornalismo”. E que entende ele por tal conceito? Nada diz, a não ser que “no futuro, o bom jornalismo dependerá da capacidade das instituições jornalísticas de atrairem clientes, proporcionando-lhes notícias e informação pelas quais eles estejam dispostos a pagar”. Percebo que esse seja o ponto de vista e a preocupação de Murdoch. Mas confesso não ver muito bem onde fica, neste cenário, a preocupação com a qualidade.

2. O que o autor escreve sobre o papel regulador do Estado também se percebe bem. Em resumo, entende Murdoch que os apoios que os governos (ele alude, no caso, aos Estados Unidos da América) possam dar aos media jornalísticos se traduzirão em dependência do jornalismo face ao poder e, por conseguinte, numa limitação da liberdade de informação e, em última instância, da própria liberdade.
Em vez de ajudar, num tempo de crise excepcional e num momento de dificuldade extrema, um grande jornal a sobreviver, por exemplo, o Estado faria melhor em deixá-lo cair e, em contrapartida, limpar os escolhos que impedem o acréscimo de concentração dos media para aqueles que podem e querem crescer. Isto é que seria pautar a actuação por critérios do século XXI e não pelos do século passado, segundo o articulista. Contudo, bem vistas as coisas, a liberdade defendida por Murdoch é, afinal, a liberdade dos poderosos de se tornarem ainda mais fortes. À custa da crise, além do mais.
Para quem coloca um título tão grandiloquente e ambicioso ao seu artigo, esperava-se talvez um pouco mais de elevação e grandeza quanto aos horizontes da liberdade propugnada.
Ainda assim, o artigo merece ser lido e estudado.

Cimeira do clima – dia histórico para a Imprensa

O arranque da cimeira do clima, em Copenhaga, fica assinalado por uma iniciativa inédita e reveladora: 56 jornais de todo o mundo, incluindo o português Público, aceitaram o repto de The Guardian e publicam hoje na primeira página um texto comum, negociado entre eles, ao longo das últimas semanas.
O texto final, divulgado em mais de 20 línguas, alerta para a “terrível emergência” que afecta o planeta e foi subscrito pelos seguintes jornais de 44 países:
“Süddeutsche Zeitung” – Alemanha,”Gazeta Wyborcza” – Polónia,”Der Standard” – Áustria,”Delo” – Eslovénia,”Vecer” – Eslovénia,”Dagbladet Information” – Dinamarca,”Politiken” – Dinamarca,”Dagbladet” – Noruega,”The Guardian” – Reino Unido,”Le Monde” – França,”Liberation” – França,”La Reppublica” – Itália,”El Pais” – Espanha,”De Volkskrant” – Holanda,”Kathimerini” – Grécia,”Público” – Portugal,”Hurriyet” – Turquia,”Novaya Gazeta” – Rússia,”Irish Times” – Irlanda,”Le Temps” – Suíça, “Economic Observer” – China,”Southern Metropolitan” – China,”CommonWealth Magazine” – Taiwan,”Joongang Ilbo” – Coreia do Sul,”Tuoitre” – Vietname,”Brunei Times” – Brunei,”Jakarta Globe” – Indonésia,”Cambodia Daily” – Camboja,”The Hindu” – Índia,”The Daily Star” – Bangladesh,”The News” – Paquistão,”The Daily Times” – Paquistão,”Gulf News” – Dubai,”An Nahar” – Líbano,”Gulf Times” – Qatar,”Maariv” – Israel,”The Star” – Quénia,”Daily Monitor” – Uganda,”The New Vision” – Uganda,”Zimbabwe Independent” – Zimbabwe,”The New Times” – Ruanda,”The Citizen” – Tanzânia,”Al Shorouk” – Egipto,”Botswana Guardian” – Botswana,”Mail & Guardian” – África do Sul, “Business Day” – África do Sul, “Cape Argus” – África do Sul,”Toronto Star” – Canadá,”Miami Herald” – Estados Unidos,”El Nuevo Herald” – Estados Unidos, “Jamaica Observer” – Jamaica, “La Brujula Semanal” – Nicarágua,”El Universal” – México, “Zero Hora” – Brasil, “Diário Catarinense” – Brasil, “Diario Clarin” – Argentina.

O texto do editorial: AQUI

Tendência para a queda nos gratuitos

Newspaper Innovation, o imprescindível “observatório” do fenómeno da imprensa gratuita no mundo, que o Prof. Piet Bakker há quase uma década acompanha através do seu blog e de uma newsletter mensal, aponta para uma tendência de queda, especialmente sentida na Europa.
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(Quadro de Piet Bakker. Clicar para ver versão ampliada)

De acordo com dados hoje divulgados, a queda do número de jornais era, nos primeiros nove meses de 2009, da ordem dos 10 por cento, depois de uma subida constante desde 1995. O declínio, no caso da Europa, teve início ainda em 2008.