Morreu Torcato Sepúlveda, um homem muito bom, um jornalista muito bom, uma pessoa que nunca deixou indiferente quem com ele se cruzou. Morreu novo, demasiado novo (56 anos). Morreu demasiado de repente, mesmo para muitos daqueles que o acompanhavam de perto e receavam por doença má. E agora estamos todos tão tristes, a recordar aquela sua figura imponente, patriarcal, aquele cabelo branco a esvoaçar selvagem, aquela voz forte, enérgica, que não conhecia as meias-tintas. Porque ele, o Torcato, não conhecia as meias-tintas. O que ele achava que era, era; o que ela achava que não era, não era. Dizia-o com todas as letras, e argumentava, mesmo que fosse aos berros, mas argumentava; se lhe contrapusessem argumentos mais fortes, racionais, aceitava-os. Isto parece tudo tão simples, mas estamos tão fartos de ver por aí gente que não é nada disto, que joga com a imagem, que diz aqui e desdiz além, que faz cálculos de cabeça a ver se isto cai bem ou aquilo cai mal… O Torcato não. Era genuíno, verdadeiro, intenso e inteiro, a costela minhota (nasceu em Braga) estava lá toda, homem da terra, da terra chã, do campo, das coisas que se sentem com as mãos. E, depois, escrevia tão bem. Gostava da língua, gostava das palavras, conhecia-as uma a uma, o seu valor, a sua cor, a sua particularidade, o seu lugar específico nesta frase ou naquele texto. E era um excelente jornalista, capaz de distinguir entre o essencial e o acessório, capaz de motivar uma equipa (apesar de algumas fúrias homéricas em momentos de maior stress por causa do fecho do jornal…), capaz de dominar desde a mais simples notícia à mais elaborada reportagem, entrevista ou crítica, capaz de cortar a direito, incapaz de fazer fretes. Sério, independente, exigente, se necessário até ao excesso, esse excesso que o fazia ao mesmo tempo tão humano, tão vivo – e tão frágil, claro… Conheci-o há muitos anos, conheci-o muito, de muito perto, a ele e às suas variadas circunstâncias. Gostava muito dele, gosto muito dele. Apetecia-me estar agora aqui a escrever muito, a recordar, a contar histórias dele e da gente, a desfiar memórias, como que a ‘obrigá-lo’ a estar vivo, a estar aqui, ao pé de mim, ao pé de nós, a não o deixar ir ainda, a recusar que ele tenha morrido já, agora, tão cedo, tão depressa. Apetecia-me tanto, Torcato…
Obrigado. Muito e muito obrigado. Paz a ti.
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