Radiografia e análise dos media em Portugal

Acaba de sair o Anuário da Comunicação 2005-2006, editado pelo OberCom. Trata-se de um modelo novo de anuário, nesta sexta edição, já que, além de uma análise pormenorizada e sistemática dos diferentes sectores do campo mediático, incorpora uma segunda parte constituída por quase duas dezenas de “olhares sobre a comunicação”, propostas por profissionais do universo académico e mediático. São 285 páginas de dados, análises e reflexões.

Anuario2006

Leituras sobre o futuro da Imprensa

A edição nº 97 da Chasqui, Revista Latinoamericana de Comunicación do Centro Internacional de Estudios Superiores de Comunicación para América Latina (Ciespal), com sede em Quito, Equador, inclui, nomeadamente, os textos seguintes:

Nasceu a infanta Sofia e à porta da clínica está um batalhão de jornalistas

Tal como fizera com a infanta Leonor, a Casa Real de Espanha anunciou hoje por SMS o nascimento da infanta Sofia. Ao final da tarde, o príncipe Felipe deu uma conferência de imprensa para divulgar o nome da sua segunda filha, para falar do parto da mulher e para dizer que estavam muito felizes. Aparentemente ninguém teve informação privilegiada. Fotos disponíveis: a do príncipe e a da mãe da princesa, que se dispuseram a tal. Neste contexto, pergunta-se: porquê os jornalistas terão marcado, com tantos dias de antecedência, lugar à porta da Clínica Rúber Internacional de Madrid, deixando lá bancos e escadotes com o seu nome? O esforço foi compensado? A notícia circunscreve-se a isto: nasceu a infanta Sofia. Porquê tanto alvoroço? Nos sites dos jornais “El Mundo”, “El Pais” e “ABC” o tema em destaque, a partir do início da tarde de domingo até à hora em que escrevo este post (perto das 22h), é o parto real. O que se passa em Espanha e no mundo deixou de interessar. Porque, como todos sabem, será muito mais importante nascer uma infanta do que analisar a quente situação política no País Basco ou na Turquia… Ou será que andamos todos muito distraídos?

As ‘minhas’ fontes

Na sua mais recente crónica, o Provedor do Diário de Notícias, José Carlos Abrantes, a propósito de uma dúvida de um leitor sobre o uso de fontes anónimas (e depois de ouvida a jornalista em causa), diz o seguinte:

O verdadeiro problema não é se a jornalista mantém a confiança na fonte. É se os leitores mantêm ou perdem a confiança no jornal.

Não imagino que se pudesse dizer isto de forma mais clara.
E lembrei-me de convocar o parágrafo depois de ter lido um post de Antonio Delgado, um auto-proclamado (e famoso) ‘heavy blogger’ espanhol em que apresenta um intrigante gráfico com aquelas que são as suas fontes.

A distância que vai da forma como um jornalista pode (ainda hoje) pensar nos seus leitores à forma como alguns desses leitores valorizam o trabalho jornalístico não deixa de ser preocupante.

Carga policial em Lisboa: factos e enquadramentos

Sobre os incidentes entre polícia e manifestantes, anteontem ao fim do dia, no Chiado, o Público titula a toda a largura da página 12 que “Bastonadas sobre manifestantes em Lisboa reabrem polémica sobre violência policial”. E acrescenta no ‘lead’: “Manifestantes acusam autoridades de ‘abuso de força’. A PSP rejeita acusação e fala de ‘vandalismo e agressões’. Houve sete feridos, cinco dos quais agentes policiais”.

O enquadramento da notícia está feito de molde a perceber-se que é à polícia que cabe dar explicações sobre o sucedido. Do ponto de vista da apreciação equilibrada e justa daquilo que se passou, julgo que não basta reduzir o problema a uma disputa entre polícia e manifestantes. Se há acusações de ‘vandalismo e agressões’, não caberia ao jornal investigar um pouco e procurar ouvir eventuais testemunhas ou vítimas?

Lendo a peça sobre o mesmo assunto publicada pelo Jornal de Notícias fica a ideia de que o trabalho não ficou, de facto, completo.

Há 33 anos

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket“Há 33 anos, de súbito, o mundo abriu-se, e o horror, que parecia irremediável e sempiterno, desmoronou-se de um momento para o outro sob os nossos olhos, deixando à vista o tamanho, desmesurado como nunca, da esperança. Foram breves e deslumbradas horas, e talvez tenha valido a pena ter vivido só por elas. Nunca, como nesse dia, estivemos tão próximos uns dos outros nem fomos tão frágeis e tão vulneráveis. Como sonâmbulos, tacteávamos convulsamente o mundo e a vida à nossa volta (o mesmo mundo de sempre, inesperadamente límpido e primeiro!), tropeçando nos nossos próprios sentimentos, sem percebermos se estávamos dentro se fora de nós. E só tínhamos uma palavra desconhecida para o que os nossos olhos viam e o nosso coração sobressaltadamente experimentava: ‘liberdade’.(…)”

Manuel António Pina, in Jornal de Notícias, 25.04.2007 (ler o texto completo aqui)

Telegraficamente

Duas indicações de agenda

Conferência “Narrating the Nation – Television Narratives and National Identities” – Universitat Rovira i Virgili – Reus (Catalunha): 4 e 5 de Outubro [call for papers até 15 de Junho]

XXII Congreso Internacional de Comunicación “Periodismo económico – viejos y nuevos desafíos” – Universidad de Navarra (Pamplona): 15 e 16 de Novembro [call for papers até 11 de Junho]

Progressos na prática da leitura

O número de leitores, em Portugal, cresceu 58% na última década, segundo dados da Marktest, apresentados hoje no Público. É verdade que, como escreve Inês Nadais, a jornalista autora da peça, a informação disponível não nos diz (ainda) o que se anda a ler – isso virá em dois estudos mais aprofundados que serão conhecidos até ao Verão – mas o facto, em si mesmo, já é positivo, num país sobre o qual se costma dizer que “lê pouco”. E lê. Basta dizer que – e passamos para a metade meio vazia do copo – ainda não vamos além dos 37 por cento. Uma minoria, portanto.
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[Critério utilizado pela Marktest: leitur de pelo menos um livro no mês anterior]

Hoje à noite, na Feira do Livro de Braga

O livro “Casos em que o Jornalismo Foi Notícia“, que coordenei com  Helena Sousa, vai ser apresentado  hoje, às 21.30, na Feira do Livro de Braga, que decorre no Parque das Exposições da cidade. A apresentação da obra estará a cargo de José Leite Pereira, director do Jornal de Notícias. Este trabalho colectivo tem como autores, além dos coordenadores, Eduardo Cintra Torres, Joaquim Fidalgo, Hália Costa Santos, Madalena Oliveira, Sandra Marinho, Sara Moutinho, Felisbela Lopes e Luís António Santos.

Mais informações em: .

Também hoje e no mesmo local e sessão, será apresentado o livro de Sara Pereira Por Detrás do Ecrã: Programas para Crianças em Portugal”, que reúne uma parte substancial da tese de doutoramento desta investigadora do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade. A obra, editada na colecção de Comunicação da Porto Editora, será apresentada por Eduardo Jorge Madureira, coordenador do projecto “Público na Escola”, do jornal Público.

O assassino manda flores

Foi correcta a decisão da rede de televisão norte-americana NBC de veicular no ar o vídeo, as cartas e as fotos que recebeu de Cho Seung-hui, coreano que matou 32 pessoas em uma universidade da Virgínia? A emissora desrespeitou os amigos e parentes dos mortos ao tornar público o que um âncora da emissora chegou a chamar de pacote multimedia? O Provedor do Leitor de um dos principais jornais brasileiros respondeu às perguntas:

“Existem situações em que não se recomenda divulgar cenas que provoquem dor profunda. Há outras em que o dever de informar é mais forte. É uma decisão às vezes dramática. Acho que a NBC (e os que a seguiram) acertou em expor o material. Havia interesse público em conhecer a mente do monstro por sua própria voz.”

(Mario Magalhães, ombudsman da Folha de S. Paulo, edição deste domingo, 22/05/07)

“Uma espécie de regra no jornalismo”

“(…) Somos o país da Europa (do Mundo?) que tem mais jornais desportivos diários, mas o que tem menos jornalismo desportivo. Os outros jornais também ignoram o tema [o folhetim da transcrição das escutas do processo do Apito Dourado no CM], porque há uma espécie de regra no jornalismo que obriga uns a desprezarem as informações que os outros obtêm. As notícias não têm um valor intrínseco: têm mais ou menos valor, consoante foram publicadas por um jornal ou pela concorrência (…)”

Ricardo Araújo Pereira, in Visão, 19.04.2007

Proibir a própria liberdade

“Os media não têm (apenas) o direito, têm o dever de noticiar e/ou denunciar os crimes, condutas ilegítimas ou irregulares, de interesse público; o País e o povo é que têm o direito de saber, de estar informados. Tais notícias claro que afectam o bom nome (ou hipotético bom nome) das pessoas singulares ou colectivas em causa. Assim, de acordo com a ‘tese’ do acórdão do STJ, passam a ser proibidas. O que significa passar a ser proibida a própria liberdade. Como é isto possível? E como é possível este ‘silêncio’, que ainda nenhum responsável, nenhum deputado, nenhum político, se tenha referido a tão grave ameaça, mesmo involuntária, à democracia em Portugal?”

José Carlos de Vasconcelos (a propósito do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça sobre o ‘Público’), in Visão, 19.04.2007

Floribella no móvel. Quanto custaria?

O primeiro episódio da nova série da Floribella foi promovido como tendo direito a apresentação antecipada na net e no telemóvel.
O apelo ao ‘fora do comum’ (o maior, o mais bizarro, o mais estranho, o mais novo…) continua a ser uma estratégia suficientemente eficiente para garantir os retornos comerciais e de imagem considerados aceitáveis pelas empresas que administram este tipo de produtos. O Big Brother – o primeiro – foi apresentado não apenas como um concurso televisivo mais como ‘a primeira novela do real’ e isso garantiu-lhe uma enorme projecção mediática em jornais, rádios e até TV’s concorrentes mesmo antes da primeira emissão.
Que os profissionais da Comunicação Estratégica ‘trabalhem’ os temas por forma a dar-lhes um ângulo jornalístico não constitui problema, muito pelo contrário.  Que os jornalistas – pressionados pelo tempo, escassez de meios, escassez de recursos, etc – só nos apresentem exactamente o que foi ‘trabalhado’ pela Comunicação Estratégica é que me parece problemático.
E quando nem mesmo as questões simples – neste caso em apreço, custos, acessos, tarifários – surgem respondidas no texto jornalístico há um largo vazio por preencher.
Temos os blogs, pois temos.
E, com tantos defeitos, valham-nos, ainda assim.
Miguel Vitorino, sabendo que este primeiro episódio pode ser visto de forma gratuita por força de um acordo entre a SIC e as operadoras, foi tentar calcular quanto custaria vê-lo no telemóvel às tarifas de mercado (tráfego avulso).
E o resultado parece ser esclarecedor; varia entre os 60 euros da Optimus e os 120 euros da TMN.

Encontrei a referência ao blog do Miguel Vitorino no Zone 41 (que a havia encontrado no do Paulo Querido).

Os media no “Público”

A impressão que se tem – afirmá-lo com certeza exigiria uma análise mais cuidada – é que o Público desinvestiu claramente no noticiário sobre os media, com a mais recente remodelação. Tal opção não foi assumida e, timidamente embora, foi até negada. Admitamos que é cedo para um balanço.

O que não  é simpático para os leitores é encontrar, dias a fio, no site do jornal, um botão que diz “media”, a gente clicar e aparecer outra coisa completamente diferente. Hoje chega-se ao ponto de ao abrir o referido botão surgir uma página de… publicidade.